Existe amor
que dure a vida toda, que a tudo perdoe e não se
desanime? Existe amor que se renova todos os dias porque
tudo sofre, tudo espera, tudo crê?
Minha ingênua e sincera fé diz que
sim, mas muitas vezes (às vezes a maioria das vezes)
o meu coração/razão/vontade não
encontra tal amor... ou, se ele está lá... se
cansa de tentar procurá-lo e fazer reviver um
sentimento assim. Não por falta de forças ou
de coragem, mas por falta de motivos.
Onde encontrar motivos para amar, então?
É possível encontrá-los quando
já não queremos ou temos medo de nos
machucarmos de novo?
Talvez as perguntas estejam sendo feitas da
maneira errada, mas não sem verdade existencial...
Todo mundo procura por estes motivos de vez em quando... Eu
gostaria que minha resposta fosse tão simples quanto
procurar no “Google”, mas eu não tenho
boas notícias sobre encontrar motivos para amar.
Geralmente nunca se acha um bom motivo para se fazer isto.
É mais fácil (e menos complicado) não
ter motivo para amar. Recusar-se a amar e trancafiar-se
solitariamente dentro de uma torre alta ou mosteiro
celibatário talvez seja a solução menos
dolorosa.
Não amar evitaria comprometer o amor e a
vida de mais algum inocente, quando, por exemplo, duas
pessoas se amam e se deixam ser amadas, mas logo no
início de suas caminhadas descobrem que é
perigoso demais abrir o coração não
só ao amor, mas às frustrações e
confrontos que a vida a dois sempre causa. Ou, quem sabe,
depois de muitos anos de caminhada juntos, descobrem que o
motivo para se amar acabou faz tempo ou nunca, de fato,
existiu. Donzelas amáveis e príncipes
heróis encantados, cavalos brancos e o salvamento da
princesa da torre são divertidos e empolgantes nas
primeiras vezes, mas se torna enfadonho ter que se trancar
na torre de novo para se proteger de uma dor ou de
escalá-la perigosamente afim de encontrar aventuras e
motivações para amar todos os dias.
Não amar certamente anularia as dores e
desilusões destes momentos, mas não é a
decisão mais completa a ser tomada. Particularmente
não creio que exista gente que foi feita para
não amar; e também não creio em amor
que vai e vem, que sobe e desce. Acredito no amor que fica,
mesmo amassado, ferido, sozinho e nos faz ter
esperança de ver hoje, no nosso agora dolorido, um
horizonte amanhã, doce e ensolarado, talvez distante,
mas alcançável de dias melhores, mais
fáceis para se amar. Dificilmente encontra-se um bom
motivo para amar persistentemente, mas quem disse que o
verdadeiro amor precisa de motivos para ser amor?
O que me faz amar com vontade de amar não
é o motivo, mas a consciência da
existência inequívoca deste amor que
está aqui dentro sem saber como. Não sei
explicar, muito provavelmente ninguém
conseguirá explicar, porque o amor é assim,
mais forte que a morte, dolorosamente persistente,
irrevogavelmente amante, paciente e benigno mesmo sem
motivos. Já tentei entendê-lo, mas eu sei que
só posso sentí-lo.
O bom e verdadeiro amor não precisa saber
dos motivos, jamais os procura ou avalia se é
possível ou não amar. Só sabe que sente
amor e pronto. Vai lá de peito e vida abertos. Ele
lança fora todo o medo, ainda que se tenha de matar
um leão por dia e a gente vá deitar cansado
todas as noites.
O amor sobrevive mesmo é de mãos
dadas com a fé e a esperança. O abraço
dado, o beijo paciente, a presença carinhosa
certamente são expressões do amor, são
veículos para nos sinalizar que ele existe e nos dar
novo ânimo, mas quando não os encontramos
não significa que não podemos amar ou que nos
faltam motivos. Dificilmente entenderemos ou reconheceremos
o verdadeiro amor somente nos atos e gestos físicos.
O amor manifesta-se em dom/dádiva, no que é
dado sem buscar interesses próprios, nem mesmo os
interesses de atender às nossas carências
afetivas são válidos para buscar amar. O amor
manifesta-se sem motivo aparente, até sem
condições, vem como um rolo compressor ou uma
simples brisa, mas vem.
É possível negligenciar o amor,
fazer de conta que não existe ou abafá-lo.
É possível ficar tão duro ao amor que,
mesmo ele existindo, não se queria mais senti-lo. O
medo da dor pode causar tudo isso, mas podemos escolher
viver por medo e não deixar o amor em paz ou, por
fé e esperança, fazê-lo brilhar como um
sol.
Amar é a capacidade de doar-se sem querer
nada em troca, talvez por isso o Senhor tenha dito que, no
final dos tempos, o amor se esfriaria de quase todos. Uma
sociedade que luta por poder e prestígio, que compra
todas as coisas: admiração e domínio.
Que concorre traiçoeiramente pelos melhores lugares e
pisa em cima de qualquer ameaça, não entende
nem aceita dar sem querer qualquer coisa como pagamento.
Pessoas que se amam, mas se interessam mais por disputar
quem ama mais do que simplesmente amar, gente que não
sabe amar só por amar, corre o sério risco de
ver esfriar a sensibilidade ao amor.
Logo, não existe pagamento para quem ama
de verdade. E quem assim ama, não aceita tais trocas
e barganhas. Continua dando, amando, crendo e alimentando a
esperança não do fim, mas do recomeço
pleno e movido pela alegria de simplesmente amar todos os
dias, tudo sofrendo, tudo crendo e tudo esperando,
até mesmo o ressurgir da sensibilidade de amar.
O Deus que assim ama te
abençoe rica, poderosa e
sobrenaturalmente!
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